O sensual, de uma forma só nossa

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quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Os gansos. Uma ripa.


 Conj.2010. Um balcão, uma atendente em seu computador. Sala de paredes amarelas, desprovidas de qualquer outro elemento. O colorido e o som da televisão me atraíram, na falta de qualquer outra opção de distração, já que fechar os olhos e me envolver em pensamentos seria impossível.
Um ardoroso grafólogo. Uma apresentadora. Um texto para análise. Nela todo o caráter e a índole de um repórter se revelando na letra dele. Nada contra. Mas não me bate. Acabei aprendendo que a letra ‘o’ tem o ‘poder’ de definir o esbanjador e o  pão-duro. Uma vez detectada a anomalia na letra, pode-se, simplesmente, inverter o adjetivo que imprime o perfil da pessoa, simplesmente mudando o formato da letra. O esbanjador se torna pão-duro e vice-versa.
‒ Ah!Ah! Que fácil! ‒ comentei com a atendente também atenta.

Quebrando a sequência do quadro, uma cena me calou: gansos, centenas, enfileirados tal qual uma marcha, procissão ou desfile, sob o comando de um homem e uma ripa ‒ comprida, larga, bem equilibrada nas mãos calejadas? que mantinham a marcha dos gansos, escuros como o asfalto quebrado, pela rua dividida com carros, carroças, caminhão. Alguns paravam respeitando a marcha em ziguezague comandada e obedecida à risca pelos gansos faceiros e barulhentos sob o comando que os protegia.

Era uma imagem inédita, ofuscante pela beleza dos gansos e destreza do comando. Desciam em direção à lagoa, onde a água límpida? aguava a grama e ondeava a cada ganso que nela mergulhava.
O Homem foi entrevistado. Por acaso um jornalista por ali passava!
‒ Eles produzem mais quando são levados a passear pelas ruas.  Nenhum foi atropelado!
Ele disse. Está dito!

Essa imagem valeu! Guardei a imagem! Que imagem! Um homem, uma ripa e centenas de gansos ‒ poderiam ser milhares, não ser gansos, poderiam ser milhões ou bilhões  de homens ‒ mulheres inclusas.
O homem poderia ser algum homem ensandecido pelo poder, ou muitos, ou máfias do crime, políticas, religiosas, ou chefes de estado, conquistadores,  máfias  terroristas, líderes enlouquecidos pela ganância e poder ou ... briga por inveja, briga por dinheiro, briga por poder, briga pela sua própria loucura. Gritos, balbúrdia, mortos. Canto, música: fúnebre? A ripa balançava, agredia, machucava ou matava! Ou os alimentava com milho jogado no chão. E os mantia dentro da ripa.

Uma ripa para centenas de gansos. Uma ripa, uma arma, centenas de armas, centenas de balas, uma forca, instrumentos de tortura... Quais? Para o corpo ou para a mente? Ou para o corpo e para a mente.
Uma ripa para centenas de homens? Número inexato? Qual seria o exato?
Bilhões de pessoas marchando obedientes, sem atropelamento.
Mas são homens (mulheres inclusas). A farsa monumental refém de medos extravagantes. Mas nelas, de repente, um(ns) descontrolado(s), um(ns) desobediente(s), outro (s) com fome, um (ns) revoltado (s), tambores tocando, drogas drogando, assassinato assassinando, crianças assassinas se assumindo, condutores atropelando...

Marcha de homens e mulheres para a câmara de gás!
Marcha de homens e mulheres para as fogueiras acesas pelos representantes de “Deus”!
Marcha de homossexuais querendo seus direitos...(alguém os negou?)!
Marcha da maconha nos lábios clamando pela liberdade da fumaça...
Marcha silenciosa e disfarçada para estupro em cadeia...
Marcha de mulheres seminuas, ou quase nuas, reivindicando: ‘eu dou pra quem eu quero’! Quem diz não?
Marchas implorando pela liberdade. Déspotas metendo a ripa!
Marcha de mulheres cobertas, tendo os olhos e as mãos livres. Ou ficaram cegas ou suas mãos tombaram ensanguentadas. Ou os dois.

Mas não há marcha contra a corrupção, com políticos politiqueiros, contra o afogamento por impostos excessivos, contra as ‘quarenta e cinco mil mulheres assassinadas por seus próximos, contra a pedofilia, crianças desaparecidas, contra mulheres seviciadas ou seduzidas pela máfia da pornografia... pelos jovens a quem foram negadas uma educação de qualidade, nem marcha de trabalhadores pelo seu direito ( a dos sindicados não contam, trabalham por eles mesmos) e... E as mulheres? Sem marcha! Conformadas.

Assim caminha a humanidade, os sinos dobram para o maior espetáculo da Terra: no palco, o entretenimento, para o corpo e para mente, que os mantém dentro do espaço protegido pela ripa, que mantém os ‘gansos’ na plateia, aplaudindo. Sem água límpida aguando a vegetação.
Entrada livre. Saída paga. Às vezes com uma vida.

Que imagem linda! A dos gansos.
Que imagem feia! A dos homens.

Continua: A ripa em Hollywood.







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